Nada de
ovos coloridos: a vida nos botecos agora tem sabor especial
Dia 22 de fevereiro de 2011.
Internazionale de Milão e Bayern de Munique jogam a partida de ida
das oitavas de final da Liga dos Campeões da Europa. O jogo tem
vários temperos: é uma repetição da final passada, em que a Inter
bateu o time alemão por 2 a 0; são dois timaços – Eto'o, Milito,
Sneider e Júlio César de um lado, Robben, Gomez e Schweinsteiger do
outro; e é o confronto de dois dos times mais importantes do mundo.
Um belo programa para se ver em
casa. Mas, que tal assistir à partida num boteco? “No trabalho
seria uma correria e em casa não tem muita graça. Aproveitei o
tempo livre para ver o jogo aqui”, diz o consultor econômico
Alfredo Bastia Junior, que assistiu à partida acompanhado de uma
porção de bolinho de bacalhau. “É muito mais legal ver aqui. Só
o bolinho já é suficiente para dar um gosto especial ao futebol”.
Esse “aqui” de que Alfredo
fala é o Boteco São Bento, no bairro do Itaim. Inaugurado em 2007,
faz sucesso desde o início. Com três ambientes, um deles ao ar
livre, é enfeitado ao centro com duas árvores. Como todo boteco, é
aberto, sem portarias ou entradas. “Dificilmente você encontra um
dia sem bom movimento”, diz Christian Palmute, da área de
marketing do boteco.
O lugar é frequentado
basicamente por jovens querendo azarar, famílias curtindo um dia de
folga, pessoas que precisam relaxar depois de um dia estafante de
trabalho. E, claro, gente que gosta de futebol. “Os dias de jogos
aqui são bem movimentados. A galera torce como se estivesse na
arquibancada, especialmente em dia de jogo com time paulista”,
garante Samuel Oliveira, o ocupado gerente de operações do lugar.
O São Bento é um exemplo da
nova geração de botecos há alguns anos presente nas grandes
cidades. Sem o rigor comportamental do restaurante e sem a zoeira do
bar, os botecos vêm ganhando a simpatia dos que gostam de curtir um
happy hour.
“Não tem música alta
repetitiva nem luzes piscando irritantemente, assim a conversa flui
mais fácil. Alguns têm sinuca e musiquinha ambiente, o que torna o
ambiente mais agradável. De vez em quando rola um jogo na tv... Ah,
cara, nem se compara”. É o que diz Rafael Montenegro, assistente
administrativo, quando perguntado por que o boteco é o melhor lugar
para se divertir. “Toda sexta-feira estou lá. Só não vou se
estiver muito ocupado ou doente de cama”.
Já Rodolfo Pazanelli destaca os
comes e bebes: “A bebida nos botecos é mais barata, e a comida
costuma ser maravilhosa”. Outra característica dos novos botecos:
o ovo colorido na estufa e a salsicha nadando no molho deram lugar a
pratos elaborados, cuidadosamente preparados para fazer valer a pena
uma esticadinha antes da volta para casa.
O São Bento, por exemplo,
oferece cerca de 50 pratos, desde as tradicionais porções até
refeições completas. A Costela do Pecado, um dos mais pedidos, vem
com a costela assada lentamente, em papel alumínio, temperada com
sal e condimentos, junto com mandioca frita e salsinha jogada por
cima. Um estrondo. Assada assim, a gordura combina com a carne e não
dá a sensação de que se está comendo carne com sebo.
Claro, num bom boteco não pode
faltar o bolinho de bacalhau, feito com batata do tipo Asterix
(aquela de casca rosada, mais seca do que as tradicionais), azeite,
bacalhau dessalgado e desfiado, alho, pimenta do reino e salsinha a
gosto. Um picadinho também cai bem: 1 kg de alcatra ou coxão mole
em cubinho de 3 cm, cebola, alho, tomate, folhas de louro,
pimenta-do-reino, salsinha e cebolinha – além do pãozinho que,
no fim, será traçado com o molho que sobra.
Também não se pode esquecer
das bebidas. A caipirinha de uva itália, roxa, terrivelmente
atraente, com cachaça, pedaços de lichia e picolé de uva. A
Bronzeado: vermelha, leva framboesa, abacaxi, lichia e picolé de
lichia. E a de manga, que leva a fruta, picolé da fruta e um
ingrediente curioso: pimenta dedo de moça. Ainda assim, é
refrescante.
Em alguns lugares, as guloseimas
são complementadas com música ao vivo. É o caso do Dona Flor, em
Moema. Todo dia, bandas de diferentes estilos musicais – pop, rock,
MPB, samba – se revezam para levar aos clientes, além de gostos,
ambientes diversos. Num dia você vai e come bolinho de bacalhau
ouvindo músicas de Caetano Veloso. No outro, manda ver um picadinho
ao som de Capital Inicial.
Há quem substitua baladas por
noites inteiras no boteco. “Numa boite a chance de encarar um
bêbado vomitando no seu pé é grande. No boteco, isso raramente
acontece”, comenta o publicitário Leandro Nunes. No máximo, você
pode ficar chateado com o erro de um jogador brasileiro – foi o que
aconteceu no jogo da Liga, quando, aos 45 do segundo tempo, o goleiro
da Inter Júlio César rebateu uma bola no pé do atacante Mário
Gomez. O Bayern venceu por 1 a 0. Mas ainda tem o segundo jogo. Vai
ser com bolinho de bacalhau de novo?
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